segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Crônica: No ônibus


Renato Queiroz Alves
O poético silêncio da espera cansada do fim do labor reina no ponto de ônibus, em que operários impacientes querem voltar para casa.
Sobe no ônibus vazio, é o ponto de partida, há pouca gente. Traz consigo, carregando nos ombros sua cesta básica, comprada todos os dias durante as duas primeiras horas de trabalho. Sendo que a primeira corresponde ao seu salário, a segunda corresponde aos seus direitos, entre eles a cesta básica, e o resto, isto é, sete horas, representam o sobre-trabalho, a mais valia, o lucro do patrão, horas roubadas do trabalho social, exploração.
Não há como mudar nada sozinho e nem tão cansado, por isso sobe no ônibus, põe sua cesta básica no chão, os braços cansados dos trabalhos, tanto concreto quanto abstrato, descansam um pouco agora.


Senta-se, a viagem começa. Há poucos ônibus nessa linha, que liga um bairro fabril a um bairro operário, por isso, aos poucos começa a chegar mais gente, cada vez mais, tanto que obriga o homem que entrou primeiro a travar sua cesta básica na parte de baixo do banco em que sentara.
Mais rostos, mais operários, sobem, chegam, alguns sentados, muitos em pé. Há homens, mulheres, velhos e jovens, todos com características comuns.
Em determinado momento a situação fica caótica, pessoas amontoam-se. Por alguns minutos, pressionado pela multidão contra a porta do ônibus,  que não pôde fechar completamente, um operário viaja em plena rodovia — das mais movimentadas— dependurado.


Aos poucos, a medida que o ônibus se aproxima do ponto final, começa a esvaziar, o amontoado começa a diminuir, rostos cansados começam a surgir.
E ali, escondida e calada, como deve ser a pequena parcela de trabalho que é, estava a cesta básica do trabalhador.

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