terça-feira, 13 de março de 2012

Manifesto de Repúdio às atrocidades praticadas contra os Povos Indígenas – Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, Brasil

imagem FDHT-MT
O Fórum de Direitos Humanos e da Terra de Mato Grosso (FDHT-MT) envia hoje carta á Ministra Maria do Rosário Nunes, Secretária de Direitos Humanos da Presidência, encaminhando manifesto trilingue (português, inglês e espanhol), pedindo providências imediatas quanto à situação dos povos indígenas no estado e em Mato Grosso do Sul.
A carta recorda o fato de o FDHT ter liderado, no final de 2011, um manifesto de apoio aos Guarani Kaiowá de Mato Grosso do Sul, encaminhado à Secretaria no início de dezembro passado, e afirma: “Hoje, a situação continua agravada e, por isso, o FDHT-MT amplia os territórios englobando os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (…). Somos 70 entidades e 201 pessoas brasileiras e estrangeiras signatárias pela justiça socioambiental, e solicitamos imediata providência que possa assegurar o mínimo de vida digna a todos os povos indígenas do Brasil”.
A íntegra da carta e o Manifesto foram enviados hoje por Michèle Sato para a lista redeaxedudu. O prazo para assinar encerrou-se ontem, dia 7 de março, mas seu texto segue abaixo, na íntegra.  TP.
Manifesto de Repúdio às atrocidades praticadas contra os Povos Indígenas – Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, Brasil
“Meu avô morreu (filho de Laranjeira) morreu assim e meu pai também. Querem nos tirar daqui novamente. Querem matar mais? Se é para morrer atropelado, de suicídio, morremos resistindo – morremos dentro de nosso tekoha” (Faride, liderança Guarani Kaiowá de Laranjeira Nhanderu).
O genocídio praticado contra os povos indígenas nos Estados de Mato Grosso (MT) e Mato Grosso do Sul (MS) prossegue em passos largos! As violências avolumam-se sistematicamente. Repudiamos a letargia dos governos estaduais e federal frente aos processos de identificação, demarcação e revisão de limites dos territórios tradicionais destes povos. Tais governos vêm cedendo, constantemente, as pressões promovidas pelo setor ruralista não efetivando os direitos constitucionais destes povos.
Denunciamos o cenário estarrecedor vivido por três povos em destaque: os Guarani (MS), os Xavante – Terra Indígena Marãiwatsédé e os Tapirapé – Terra Indígena Urubu Branco (MT).
“Tekoha”, palavra na língua do povo Guarani para referir-se a terra tradicional, não se pode traduzir para os conceitos da sociedade não indígena. Numa aproximação, poderíamos dizer lugar onde se convive, se mantém a relação com os demais e com os antepassados, onde a vida se multiplica na relação cosmológica que vai além do físico, do visível e do palpável. Contrapondo, violentamente, a esta forma de relação com a terra, os promotores do latifúndio e do agronegócio em Mato Grosso do Sul vem, progressivamente, expulsando, atacando em emboscadas e assassinando, principalmente, as lideranças Guarani Kaiowá, desde que este povo decidiu negar-se ao confinamento em micro-espaços, insuficientes para qualquer das dimensões que atribuímos ao tekoha.
Em Mato Grosso, uma situação igualmente preocupante e escandalizadora é vivida na Terra Indígena Marãiwatsédé, de onde os Xavante foram literalmente expulsos em 1966. Após retornarem em agosto de 2004 para seu território, passando antes dez meses à beira da estrada e mesmo depois da unanime decisão favorável no Tribunal Regional Federal de Brasília, este povo ainda não tem integralmente seu território tradicional. Nesta indefinição, postergando a retirada dos invasores do território, o Estado cria o ambiente para as ameaças, para a destruição do pouco que resta da natureza do território e contribui para que os invasores permaneçam no local. O clima de tensão persiste, com risco de acirramento do conflito com os invasores a qualquer momento. Marãiwatsédé inscreve na circunstância da mais perversa barbárie da política mato-grossense, em que testemunhamos os descalabros das invasões de terra, desmatamento, fome, doenças, abandono e violência.
Circunstâncias semelhantes são sofridas pela etnia Tapirapé da Terra Indígena Urubu Branco. O conflito ocorre em virtude da permanência de invasores na área norte do território indígena, que continuam a depredar impunemente a área. As ameaças são constantes contra as lideranças deste povo tendo, inclusive, ocorrido um atentado ao cacique.
A saga destrutiva promovida, secularmente, nos territórios indígenas pelo Estado brasileiro, visto como “terra de ninguém”, é também praticada na morosidade do seu papel de executor da justiça, assim como, na distinção feita ao alocar prerrogativas a alguns invasores sobre o inalienável direito de viver dos povos indígenas. A dominação privada dos bens, para o chamado desenvolvimento, configura-se, na prática, como excludente e elitista, que sobrepõe interesses econômicos individuais aos interesses coletivos, destruindo a biodiversidade e impedindo o acesso a terra para viver e produzir e a manutenção de modos de vida singulares.
Se este mesmo Estado é, em tese, a materialização da representação de seu povo, não atende, efetivamente, os anseios deste. Assim, para que o Estado contemple a maioria “marginalizada”, os signatários deste manifesto solicitam agilidade no processo de demarcação das terras guarani (MS), assim como, presteza em cumprir a lei nos casos conflitivos vividos pelos Xavante e Tapirapé (MT).
Lutamos por um Estado de todos nós,
que considere os Direitos Humanos e da Terra,
e mantenha viva e digna a luta de Marçal!
MARÇAL -TUPÃ GUARANI
Luiz Augusto Passos
Empresta o sangue que dança nas chamas
da liberdade que amanhece em ti!…
Marçal, Marçal, és profeta de um novo canto
De uma terra livre, sem quebrantos,
Que é compromisso dos que estão aqui!
Marçal, Marçal, tua morte só apressa o dia
Em que o alto preço desta covardia será
Cobrado pelos Guarani!
Cuiabá, 08 de março de 2012.


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